Entrevista por: Humberto Silva
Prestes a terminar o seu terceiro mandato, o segundo e último enquanto Presidente da Direcção da APOIAR, Armindo Roque faz ao jornal “APOIAR” um balanço dos últimos doze anos desta instituição de apoio aos ex-combatentes vítimas de stress de guerra. Combatente na Guiné e dirigente associativo desde o 25 de Abril, eis o testemunho e balanço de uma fase que cumpre até ao fim dentro do que é estatutariamente permitido.
Armindo Matos Roque, nascido em Angola, em 1950, passou toda a sua infância nas matas africanas. O pai, médico, era colocado, no seu início de carreira, como Delegado de Saúde, em pequenas povoações sede de concelho. Desta forma, esteve também em S. Tomé e Príncipe e Moçambique. Por fim, acabou por ir fazer a Guerra à Guiné em 1972/74, em Jolmete – Rio Cacheu e em Cadique na Mata do Catanhez.
É licenciado em História pela Faculdade de Letras de Lisboa.
Vítima de acção subversiva
Enquanto combatente fez a recruta em Santarém em Julho de 1971, onde tirou o curso de Sargentos milicianos. Poucos dias depois de assentar praça, a poucos metros de onde se encontrava a fazer instrução, explodiu o paiol desse quartel que tinha sido armadilhado pela oposição. Foi a maior acção subversiva feita em Portugal continental. Logo aí começou a sua guerra. Transitou depois para Sacavém onde tirou o curso de Mecânico Auto.
Combatente na Guiné
Em Setembro de 1972 seguiu para a Guiné, tendo sido colocado em Jolmete, um local onde terminava a picada, um cu de judas, como diria Lobo Antunes, junto ao rio Cacheu. No início de 1973 foi transferido de companhia. Essa companhia foi deslocada para desocupar a Mata do Catanhez e foi abrir um quartel em Cadique, cujo objectivo era rasgar uma estrada para atravessar essa mata sagrada, libertada pelo PAIGC, em 1963. Aí dormia-se em tendas, no meio da lama, em valas cavadas pelas próprias mãos a pá e pica, sem arame farpado, sem iluminação, sujeitos a ataques de toda a ordem inclusive de foguetões. De tal forma que Armindo Roque por vezes preferia sair para o mato, onde se sentia mais seguro do que no quartel. De volta para à sua companhia original estacionou três dias na CCS, no Pelundo, a aguardar transporte. Logo no segundo dia este quartel foi violentamente atacado. Chegado ao seu quartel, ainda não curado dos ferimentos do ataque anterior, este é também violentamente flagelado com grande número de mortos incluindo mulheres e crianças. Apesar da sua especialidade de mecânico auto acabou por ser um dos militares do seu batalhão que mais vezes esteve em combate e com maior intensidade de fogo. Esta comissão terminou, em Maio de 1974, na segunda vinda de férias a Portugal, já depois do 25 de Abril, ao sofrer um acidente de automóvel, estando oito anos hospitalizado no Hospital Militar Anexo, ficando com defiência motora para o resto da vida. Foi qualificado DFA por stress de guerra, que lhe foi detectado com trinta e cinco anos de idade.
Hospital Militar
“De facto a minha luta começou logo no Hospital Militar Anexo, em 1974, onde reivindicámos que não fosse nem mais um soldado para as colónias, toda a gente votou a favor. Se havia estressados de guerra era aí. Cegos, amputados, doentes de toda a espécie acabados de chegar da frente de combate: a guerra era pior que o inferno. Mas foi talvez aí que fizemos a nossa primeira grande terapia de grupo sem sabermos que o estávamos a fazer: falávamos da guerra com grande descontracção até às tantas da manhã e até gozávamos com as deficiências uns dos outros: era a juventude.
Foi no hospital militar onde foram criadas comissões de doentes que desencadeamos a primeira manifestação de deficientes: do Anexo, na Artilharia 1, para o Rossio, a fim de exigirmos podermos sair diariamente do Hospital e não apenas às quartas-feiras como antes do 25 de Abril.”
Sócio fundador da ADFA
Foi um dos sócios fundadores da Associação dos Deficientes das Forças Armadas (ADFA), esteve na ocupação do Palácio da Independência onde dormiu uma série de noites para o Copcon não ir lá desocupar aquilo pois queriam ali fazer uma messe de oficiais.
Participou activamente nas reuniões da terça–feira para a discussão do caderno reivindicativo que foi apresentado ao Presidente da República e que levaria à aprovação do Decreto Lei 43/76.
Luta Setembro 75
A 20 de Setembro de 1975 a ADFA fez uma manifestação até ao Palácio de Belém para apresentar as suas reivindicações ao Presidente da República, Costa Gomes.
Este não nos recebeu e os membros da Direcção e da Assembleia Geral, vieram com o Conselheiro da Revolução, Marques Júnior, dizer-nos que o nosso problema iria ser resolvido e que podíamos desmobilizar.”
Nessa altura eu peguei num megafone e disse que a Direcção estava a trair-nos e lancei a palavra de ordem ‘ninguém arreda pé’: tive o apoio de todos. De imediato formámos uma Comissão de Luta, a primeira em Portugal, e assumimos o poder em nome da Direcção. Redigimos um comunicado que foi lido nos microfones do Rádio Clube a convocar os sócios e o povo para a luta. A adesão foi extraordinária De imediato encerrámos a marginal em frente ao Palácio de Belém assim como toda a circulação dos eléctricos em frente ao mesmo. A Polícia Militar teve ordens para nos desocupar, em vez disso vieram dizer-me que se colocavam à nossa disposição. Pedi-lhes para controlarem uma barricada que entretanto tinha-mos erguido na marginal, para evitar desacatos.
A Emissora Nacional, no Quelhas, foi ocupada à noite e os seus microfones ficaram por nossa conta. Aí montámos o nosso quartel general de onde cercámos o Palácio de S. Bento.”
No dia seguinte ocupámos as portagens da ponte 25 de Abril passando os automobilistas sem pagar portagem. De igual forma se procedeu nas portagens da auto-estrada do norte e na ponte de Vila Franca.
Esta luta que durou quase um mês e obrigou o Governo a assinar o decreto lei 43/76, que reconheceu os direitos à indemnização e à reintegração social dos deficientes das Forças Armadas (DFA) que é considerado, ainda hoje, a bíblia dos DFA.
Nesta luta os deficientes portugueses puseram-se de pé e nunca mais ninguém os viu mendigar.
Foi eleito várias vezes para membro dos órgãos sociais centrais da ADFA de cujo jornal, o “ELO”, foi jornalista durante muitos anos. Nesta organização desempenhou também actividades no âmbito da animação cultural.
Barreiras invisíveis da integração
Tem investigado a problemática das barreiras invisíveis da integração da pessoa deficiente desde 1984 tendo editado diversos artigos sobre este assunto.
Em 1994 e 1995 aprofundou este tema integrado numa equipa constituída por quatro investigadores das áreas de história, linguística, direito e sociologia num trabalho de investigação realizado na ADFA cujas conclusões foram publicadas em “As Barreiras Invisíveis da Integração” e difundido na RTP em vários programas.
Nas lutas da APOIAR de 1999 a 2001
Foi Secretário da Direcção Nacional da APOIAR durante os anos de 1999 a 2001. Participou de forma muito activa nas reuniões havidas na Assembleia da República, assim como na direcção das lutas de rua que foram organizadas com o objectivo de aprovar a lei 46/99 que reconhece como Deficientes das Forças Armadas as pessoas com “stress de guerra e que criou a Rede Nacional de Apoio o que levou à assinatura em Janeiro de 2002 do protocolo que a APOIAR tem com o Ministério da Defesa e que nos permite pagar honorários aos médicos, aos psicólogos, à assistente social em virtude das consultas que são dadas. Foi aprovada em 2001 a Lei (9/2002) Contagem de Serviço Militar. De realçar que estas leis foram aprovadas por unanimidade na Assembleia da República.
Depois de um interregno de três anos voltou à Associação como Presidente da Direcção. Aqui fica a entrevista, em jeito de balanço.
ENTREVISTA
APOIAR: Já são muitos anos de associativismo. Onde é que começou e como é que veio parar à APOIAR?
Armindo Roque: Vim parar à APOIAR por convite da Drª Fani Lopes que me deu, em 1994, uma ficha para preencher. Ela tinha sido minha psicóloga em 1986, salvou-me a vida e a de muitos outros. Fomos os primeiros a ser tratados no Serviço de Terapia Comportamental do Hospital Júlio de Matos dirigido pelo Dr. Afonso de Albuquerque. Foi a partir deste grupo de doentes e técnicos que surgiu a APOIAR. Participei na Assembleia Geral da fundação da APOIAR que se realizou no Anfiteatro do Hospital Júlio de Matos.
AP: Em todos estes anos de luta pelos direitos dos ex-combatentes quais foram os momentos mais importantes?
AR: Foram a Luta de 20 de Setembro de 1975 com a aprovação do Decreto Lei 43/76 e as lutas de 1999-2000 que levaram à aprovação da Rede Nacional de Apoio; Lei 50/2000 e à Lei 9/2002, a da Contagem do Tempo.
AP: Estando no final do segundo mandato enquanto Presidente da Direcção da APOIAR, que balanço faz destes seis anos à frente desta associação?
AR: O primeiro balanço público e evidente foi feito pelo Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional pela voz da sua adjunta Drª Felicidade Batista no 16º Aniversário da APOIAR, ao classificar o nosso trabalho como notável. Os nossos associados quase todos os anos têm distinguido os nossos Relatórios de Actividades e Orçamentos com louvores.
No entanto, conforme foi dito pelo nosso Presidente da Assembleia Geral, Dr. Afonso de Albuquerque, também no último aniversário da APOIAR, que é um caso inédito serem os utentes do foro mental a mandarem nos técnicos pois o que acontece é geralmente o contrário. O facto de termos demonstrado que apesar da nossa deficiência mental somos capazes de orientar uma Associação desta dimensão e com esta complexidade foi a nossa maior vitória. As duas Direcções foram compostas por homens e mulheres com stress de guerra ou com stress de guerra secundário e levaram a sua tarefa até ao fim. O segundo aspecto positivo que se relaciona com o primeiro é que passámos a ter Assembleias Gerais “civilizadas” onde foi possível discutir com toda a liberdade mas também com grande sentido cívico e com grande entusiasmo toda a matéria associativa e as grandes questões que se prendem com a unidade dos Combatentes e dos deficientes em geral. A isto não foi alheia a postura dos Presidentes da Assembleia Geral, José Arruda e Afonso de Albuquerque assim como dos Presidentes do Conselho Fiscal António Santinho e Álvaro Santinho que foram sempre muito sensatos, ponderados, corajosos e da estatura moral dos grandes homens: e por último a participação de mulheres nos órgãos sociais e de uma maneira geral em toda a vida associativa, caso único em associações de combatentes.
Tivemos dois tesoureiros de uma honestidade e profissionalismo a toda a prova que não se negaram a esforços e a grandes sacrifícios pessoais para servirem a APOIAR: refiro-me a Regina Andrade e a João Cruz que dirigiram esta importantíssima área financeira sem mácula neste último mandato com o superior apoio de Daniel Justino.
A única pessoa que também esteve nestes dois mandatos como membro efectivo da Direcção foi o vice-Presidente Albino de Sousa, homem humilde, que não gosta de aparecer na fotografia, mais de fazer do que de falar mas que tem sido de uma grande importância para a APOIAR sobretudo no desenvolvimento da vida associativa e na Federação Portuguesa das Associações de Combatentes.
Por outro lado o nosso jornal ganhou uma grande vivacidade e dinamismo pluralidade de opiniões devido ao trabalho conjunto desenvolvido pelo seu Director Marques Correia e por você, Humberto Silva enquanto técnico superior de comunicação social.
Não podemos deixar de realçar que as nossas duas principais reivindicações foram atingidas: a competência de preenchermos o Modelo 2, cujo Protocolo com o Secretário de Estado da Defesa assinei em 2007: e a publicação da Lei 3/2009 que regulamentou a Lei 9/2002; para além disso o stress post-traumático, por proposta minha e com parecer do Dr. Afonso de Albuquerque, passou a constar da Lei da Tabela Nacional das Incapacidades, também em 2007.
Na área do movimento associativo passou-se praticamente do zero para mais de mil participações em eventos: excursões, acampamentos, festas etc.
No âmbito da Rede Nacional de Apoio, com as mesmas verbas e apenas com mais um psicólogo, passámos de mil consultas em 2004 para cerca três mil e quinhentas em 2009, um crescimento de 250%. Associaram-se mais 500 sócios neste período, um crescimento de 14%.
Ao nível dos trabalhadores todas as situações foram regularizadas de forma a deixarem de haver falsos recibos verdes, pois os trabalhadores encontravam-se com contratos precários e a associação quase nada descontava Segurança Social, nem para o IRS. Agora está tudo registado e como tal são feitos os devidos descontos. Tudo é feito com a máxima legalidade e transparência. Quero no entanto realçar que mesmo os trabalhadores independentes têm férias e licença de parto. Por outro lado, nestes seis anos, os ordenados foram pagos sempre o mais tardar até ao dia 25 de cada mês e sempre foram aumentados de acordo com a função pública e muito mais que isso a técnica administrativa, que tinha um ordenado miserável. Criou-se uma equipa coesa não houve despedimentos pelo contrário foi admitido mais um psicólogo e um técnico superior de comunicação social a tempo inteiro e admitimos há pouco tempo duas estagiárias. Todas estas condições foram fundamentais para um bom ambiente de trabalho e de confiança mútua para que os nossos sócios pudessem ter sempre o melhor apoio possível.
Um aspecto fundamental é que todo o trabalho dos actuais órgãos sociais é gratuito conforme mandam os Estatutos da APOIAR, contrariamente ao que sucedia com o meu antecessor, Mário Gaspar, que ganhava 500 euros mensais (100 contos) o que dava 6.000 euros por ano e em seis anos somaria 36.000 euros (trinta e seis mil) Ora isto multiplicado por dois ou três iria para os cem mil euros.
Em contrapartida, com esse dinheiro pudemos contratar uma advogada, algo que não existia, e agora temos mais uma advogada estagiária a tempo inteiro para que possamos avançar com a colocação de casos em tribunal pois alguns são verdadeiros escândalos. Por outro lado o património da associação é muito maior hoje do que era há seis anos: só a máquina de fazer os jornais vale 25.000 euros.
Ao nível dos grupos de ajuda mútua criaram-se três grupos e estão para iniciar mais quatro: um no Algarve, outro em Ourém e um na Madeira para além de mais um de mulheres.
Na nossa actividade externa fomos sócios fundadores da Federação Portuguesa das Associações dos Combatentes pertencemos aos seus órgãos sociais e eu próprio sou Presidente do Conselho Fiscal.
Como associados da CNOD temos tido uma acção interventora o que é muito importante para a forca das associações de deficientes que na nossa opinião se devem manter unidas e coesas à volta de uma estrutura que as represente.
AP: O que acha que ficou por fazer?
AR: Foram os voluntários! Esta casa parece que tem um íman que repele os voluntários. Existe uma estrutura muito pesada, estilo função publica, que não quer outras pessoas a trabalharem gratuitamente. Parece que têm medo que lhes tirem o emprego. Não entendem que é precisamente o contrário: quanto mais movimento houver mais trabalho terão!
AP: Fazendo uma retrospectiva desde o início da Associação APOIAR, acha que o stress de guerra é hoje visto de maneira diferente do que era há 15 anos?
AR: Não há dúvida nenhuma e isso deve-se sobretudo e antes de mais nada ao trabalho muito corajoso desenvolvido pelo Dr. Afonso de Albuquerque e pela Dr. Fani Lopes não há 15 mas há 25 anos. Foi sobretudo o seu trabalho: começaram a salvar vidas humanas era uma calamidade e o exemplo vinha do que estava a acontecer com os combatentes da Guerra do Vietname. Mais tarde foi a própria Federação Mundial dos Antigos Combatentes e Vítimas de Guerra que se começou a interessar pelo assunto e as coisas ganharam novo impulso obrigando mesmo o Governo a tomar medidas.
Com a Guerra do Iraque e o elevadíssimo número de baixas do foro psiquiátrico (15%) este problema saltou para as bocas do mundo.
Nos últimos seis anos, em Portugal, temos visto sobretudo que as associações, a começar pela nossa (um aumento de mais de 250%) têm dado mais apoio aos combatentes.
Alguns dirigentes corruptos têm sido corridos, nomeadamente os anteriores presidentes da Direcção da Associação dos Veteranos de Guerra de Braga, e isso era um grande problema que dava uma péssima imagem à problemática do stress de guerra e que prejudicava todas as associações e todos os doentes. Com as medidas implementadas pela DGPRM do Ministério da Defesa Nacional, em fins de 2005, que visaram maior rigor e transparência na aplicação das verbas na Rede Nacional de Apoio o problema foi moralizado e ganhou maior credibilidade na comunidade científica, no meio castrense e na opinião pública em geral.
Também a investigação científica que se tem vindo a realizar tem dado um grande contributo nesse sentido.
AP: Que importância têm hoje as associações como a APOIAR? Se não existissem o que seria dos ex-combatentes e da sua doença?
AR: As associações são fundamentais uma vez que o Ministério da Saúde não tem capacidade, competência nem vontade política para resolver o problema. Felizmente que com o protocolo com o MDN os combatentes podem recorrer a três ONG: APOIAR; ADFA e APVG em breve também a ANCU. A Liga dos Combatentes desde há três anos que também já vem dando algum apoio o que é bastante significativo do ponto de vista das mentalidades e das verbas que são para aí canalizadas, pois ainda há poucos anos dizia que só os cobardes sofriam de stress de guerra. Mas o mais importante foi o Congresso dos Combatentes realizado em 10 de Junho de 2008, por iniciativa da FEPAC, a que depois se agregaram todas as associações de combatentes e a Liga dos Combatentes, com um empenho muito especial. Juntaram-se também as associações de militares profissionais numa unidade nunca vista nem antes do 25 de Abril o que é muito salutar. Um dos assuntos mais discutidos nesse Congresso, que vai ficar para a História, foi precisamente a problemática do stress de Guerra.
AP: Em termos dos direitos dos combatentes o que acha que de mais importante se conseguiu e o que ainda falta conseguir para que consiga a dignidade reivindicada pelos ex-combatentes portugueses?
AR: Em termos de legislação temos da legislação mais avançada e a Rede Nacional de Apoio é algo de muito importante e inovador embora não reconheça ainda os direitos das mulheres o que é uma falta grave.
Mas o pior problema é o de não se atribuir o grau de invalidez de acordo com os problemas que a deficiência provoca. A deficiência mental é hoje das mais incapacitantes e abrange um número cada vez maior de pessoas é por isso um problema iminentemente político nas suas diversas vertentes e que atravessa transversalmente toda a sociedade e vários ministérios.
AP: Sente que ainda há uma divisão hierárquica nos ex- combatentes e que a unidade entre todos se ressente dessa divisão? Ou seja, que há quem ache que existem reivindicações que não fazem sentido ou que são mais importantes do que outras?
AR: Infelizmente há! Acho que cada associação defende os seus próprios interesses e eu não me imiscuo neles. O importante é o que nos une: o problema da condição militar; da saúde; do Estatuto do Combatente; das honras militares; da terceira idade, etc. No entanto, no Congresso onde foi amplamente discutida a questão da Condição Militar foi reconhecido que ninguém merece mais pertencer à família militar que os Combatentes, sobretudo os que estiveram na frente de combate e que morreram ou ficaram com deficiências mentais ou físicas.
Quanto a nós é mais um problema político. Temos recebido provas de grande solidariedade por parte de militares de todos os postos.
AP: Sente por exemplo que mesmo dentro das forças armadas o stress de guerra é ainda mal compreendido?
AR: Creio que não! Eles viram as barbas a arder, viram o que se está a passar no Iraque e no Afeganistão com 15% de baixas por Stresse de Guerra. O MDN tomou medidas: os nossos actuais combatentes e os seus familiares estão a ser muito bem acompanhados e tanto quanto tem sido divulgado os problemas têm sido poucos.
AP: Numa altura em que o relógio aperta para muitos ex-combatentes, tendo em vista a idade avançada em que muitos já se encontram, que futuro vê para os inúmeros casos ainda não resolvidos de stress de guerra?
AR: Existem muitas coisas que podem ser feitas sendo que a unidade na luta de todas as associações de combatentes e de todas as associações de militares e para-militares são fundamentais para uma causa que nos é comum: os policias, os soldados da GNR são cada vez mais vítimas de stress post traumático com muitos casos de suicídio e grande número de baixas psiquiátricas.
Em segundo lugar a lei tem de ser cumprida no que respeita aos prazos: os processos já não demoram três ou quatro anos no Ministério da Saúde para fazer o Modelo 2, mas demoram o mesmo tempo na CPIP para darem um parecer e demoram mais de oito ou nove anos no total.
Tem de haver uma denúncia pública e os casos devem ser postos em tribunal.